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quarta-feira, 17 de fevereiro de 2016

“Catolicismos” ideológicos de esquerda e de direita: heresias farisaicas disfarçadas de zelo


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“Nisto conhecerão todos que sois meus discípulos: se vos amardes uns aos outros” (João 13,35).
Não existe absolutamente nenhuma forma de “provar” o próprio catolicismo que não seja o amor ao próximoE como se prova o amor ao próximo? Cristo responde: “Ninguém tem maior amor do que aquele que dá a sua vida pelos seus amigos” (João 15,13).
E quem é amigo de Cristo?
Cristo responde: “Vós sois meus amigos se fizerdes o que vos mando” (João 15,14).
E o que Cristo nos manda?
Cristo responde: “Amai os vossos inimigos, fazei bem aos que vos odeiam, orai pelos que vos maltratam e perseguem. Deste modo sereis os filhos de vosso Pai que está no céu, pois Ele faz nascer o sol tanto sobre os maus como sobre os bons e faz chover sobre os justos e sobre os injustos. Se amais somente os que vos amam, que recompensa tereis? Não fazem assim os próprios publicanos?” (Mateus 5,44-46).
Tudo isso deveria ser a coisa mais batida do universo para qualquer um que tem o atrevimento de se dizer “cristão autêntico”.
Mas…
Assim como ocorria no tempo do próprio Jesus sobre esta terra, o aparente zelo religioso pode ser um abominável disfarce para um nível assassino, apóstata, diabólico de egoísmo, vaidade, arrogância, sectarismo e desprezo escandaloso pelo próximo.
Aparentavam grande zelo aqueles que não hesitavam em “coar um mosquito e engolir um camelo” (cf. Mt 23,24), denunciou Jesus depois de descrevê-los: “Atam fardos pesados e esmagadores e com eles sobrecarregam os ombros dos homens, mas não querem movê-los sequer com o dedo” (Mt 23,4). Mais veemente ainda: “Ai de vós, escribas e fariseus hipócritas! Percorreis mares e terras para fazer um prosélito e, quando o conseguis, fazeis dele um filho do inferno duas vezes pior que vós mesmos” (Mt 23,15).
Os fariseus hipócritas prezam a forma acima do conteúdo. Para eles, o importante é o protocolo, a regra, a lei exterior – mesmo que o espírito seja traído da mais nefasta e satânica maneira em nome das aparências.
Um fariseu preza as exterioridades e se preocupa com as aparências, formalidades e rigidezes protocolares. E não há nada de errado nisto – desde que não se fique apenas nisto. “Ai de vós, escribas e fariseus hipócritas! Pagais o dízimo da hortelã, do endro e do cominho e desprezais os preceitos mais importantes da lei: a justiça, a misericórdia, a fidelidade. Eis o que era preciso praticar em primeiro lugar, sem contudo deixar o restante” (Mt 23,23).
Justiça, misericórdia, fidelidadeAmor ao próximo – inclusive aos inimigos. Amor ao próximo até dar a vida pelos amigos. Orar pelos que nos perseguem. Perdoar até setenta vezes sete. “Eis o que era preciso praticar em primeiro lugar“.
O erro dos fariseus, que se explicita nas suas palavras e nos seus atos (porque “pelos seus frutos os conhecereis“, cf. Mt 7,20), é umerro de priorização.
Nos tempos atuais, como em qualquer outro tempo, esses erros continuam a ser cometidos na priorização da forma, do protocolo, da regra, que, mesmo sendo necessários, não podem jamais sobrepor-se ao amor. Afinal, é só a serviço do amor que existem as formas boas de comportamento.
O papa Francisco vai a Cuba? Não pode. É comunista. Mas e o amor ao próximo? Não pode. É comunista. Mas como ajudar os cubanos a viverem a fé com liberdade sem ir até as causas da sua falta de liberdade para superá-las com amor, misericórdia, justiça? Não pode. É comunista.
O papa Francisco se encontra com o patriarca Kirill? Não pode. É laranja da KGB. Mas e a reconciliação? E o pedido de Cristo “para que todos sejam um”? Não pode. É laranja da KGB. Mas a Igreja ortodoxa existe há mil anos, séculos e séculos antes do surgimento da KGB. Não pode. É laranja da KGB.
O papa Francisco escreve uma encíclica sobre o cuidado da nossa casa comum? Não pode. É New Age, ecologismo e comunismo verde. Mas Deus não nos confiou o cuidado responsável da criação já no primeiro livro da Bíblia? Não pode. É New Age, ecologismo e comunismo verde. Mas Jesus mesmo não estava sempre em contato com a natureza, não contemplava e citava constantemente em suas parábolas e discursos as sementes, os ramos, as árvores, os campos, os lírios, as flores, o trigo, os frutos, o mar, os pássaros? Não pode. É New Age, ecologismo e comunismo verde. E São Francisco de Assis, que chamava de irmãos e irmãs o sol e a lua e os animais e plantas? Não pode. É New Age, ecologismo e comunismo verde.
O papa Francisco fala de justiça na distribuição dos bens materiais? Não pode. É teologia da libertação. O papa defende uma economia a serviço das pessoas e não pessoas a serviço da economia? Não pode. É teologia da libertação. Ir até as periferias da existência, promover a equidade no acesso aos recursos, garantir uma sobrevivência digna, derrotar o pecado gravíssimo da usura e da ganância? Não pode. É teologia da libertação.
O papa Francisco denuncia a cultura do descarte e da coisificação dos seres humanos? Não pode. É obscurantismo e insensibilidade reacionária. O papa arremete contra a irresponsabilidade no desfrute inconsequente do sexo? Não pode. É obscurantismo e insensibilidade reacionária. O papa reitera que o aborto é um crime abominável, perpetrado em nome do egoísmo, do utilitarismo e da eugenia, que inventaram o suposto “direito” a ter “filhos perfeitos”, como se uma vida humana fosse comparável a um “sonho de consumo”? Não pode. É obscurantismo e insensibilidade reacionária.
O papa Francisco reafirma a doutrina moral da Igreja?Não pode. É dogmatismo e intolerância. Ele reitera que o sacerdócio instituído por Cristo foi confiado somente aos seus discípulos homens? Não pode. É dogmatismo e intolerância. O papa Francisco reafirma que o matrimônio – não só cristão, mas natural – é exclusivamente entre um homem e uma mulher, é indissolúvel e é aberto à vida? Não pode. É dogmatismo e intolerância.
O papa Francisco prioriza a misericórdia na pastoral familiar? Não pode. É modernismo, heresia e sentimentalismo. Os casais em segunda união devem receber compreensão, amor e misericórdia, precisamente porque é necessário testemunhar ao mundo o compromisso indissolúvel do matrimônio para as próximas gerações? Não pode. É modernismo, heresia e sentimentalismo. Os homossexuais não devem ser julgados e condenados, mas sim acolhidos com respeito, fraternidade e amor cristão? Não pode. É modernismo, heresia e sentimentalismo. Mas Cristo não andava com as prostitutas, pecadores e publicanos? Não pode. É modernismo, heresia e sentimentalismo. Mas Cristo não acolhia e oferecia amor e misericórdia a samaritanos, pagãos e romanos drasticamente imorais? Não pode. É modernismo, heresia e sentimentalismo.
O papa Francisco pede acolhimento para migrantes e refugiados? Não pode. São terroristas infiltrados. O papa mandou abrir as portas das igrejas de todo o mundo para acolher os refugiados, ainda que não sejam cristãos, ainda que sejam muçulmanos? Não pode. São terroristas infiltrados. Mas muitos deles são crianças. Não pode. São terroristas infiltrados. Mas milhares deles, mesmo muçulmanos, estão sendo perseguidos, torturados e assassinados em seus países. Não pode. São terroristas infiltrados. E as obras de misericórdia? Não pode. São terroristas infiltrados.
O papa Francisco pede ecumenismo entre os cristãos e diálogo civilizado e amoroso com as outras religiões? Não pode. É estupidez, frouxidão e traição. Mas como é que os não cristãos vão conhecer a Cristo se os cristãos não O testemunharem na prática? Não pode. É estupidez, frouxidão e traição. E como vai brilhar a nossa luz diante dos homens se a escondemos deles, recusando-nos até a manter contato? Não pode. É estupidez, frouxidão e traição.
Os fariseus de esquerda e direita estarão sempre a postos para condenar a justiça, o amor e a misericórdia em nome de regras e protocolos, esquecendo que as regras e protocolos só fazem sentido quando baseadas precisamente na justiça, no amor e na misericórdia.
Diante da tentação constante do farisaísmo de direita e de esquerda, sejamos justosamemos e pratiquemos a misericórdia.
Afinal, “ainda que eu falasse as línguas dos homens e dos anjos, se não tiver amor, sou como o bronze que soa, ou como o címbalo que retine” (I Coríntios 13,1).
Afinal, “ama e faz o que queres” (Santo Agostinho), porque, se amas de verdade, só vais querer fazer o melhor pelo próximo.
Amemos. Com obras. Na prática. Inclusive aos inimigos. Até dar a vida. Isto é o Evangelho. Isto é o cristianismo.
O resto é ideologia farisaica.

Fonte: Aleteia

terça-feira, 31 de março de 2015

PÁSCOA 2015

“A morte foi tragada pela vitória; onde está, ó morte, a tua vitória? Onde está, ó morte, o teu aguilhão?” (1Cor 15,54b-55)

         Caríssimos leitores e leitoras: “O Senhor ressuscitou verdadeiramente, Aleluia!”. Este é o canto que nesta data se eleva de todas as bocas em que o sentido da Páscoa não se perdeu. Páscoa é passagem; passagem e ressurreição. O Senhor prometeu ao povo emigrado, que sofria, a duras penas, a escravidão – como promete também a nós, emigrados da verdadeira pátria, no exílio desta terra, e sofrendo sob o peso das mil e uma escravidões que não fazem esquecer a nossa verdadeira pátria – prometeu que passaria e que seria um sinal de salvação.

         E, na plenitude dos tempos, o Senhor veio, assumiu por nós a figura de nossa miséria, o que era promessa se tornou realidade, o que era passagem se ternou conversão, e o que era libertação do jugo estranho se tornou salvação definitiva e vida eterna. Por isso é a Páscoa, realmente, a chave do cristianismo. E está intimamente ligada ao Natal. Ora, se nesta solenidade devemos nos alegrar de Deus ter nascido como homem na mais humilde das condições humanas é porque um dia ressuscitará da morte para que o homem possa ser elevado à visão divina, pois a humanidade de Cristo só tem sentido em razão da sua divindade. O Natal só tem sentido pela Páscoa.

         Desta forma, enquanto no Natal Deus se fez homem para partilhar dos sofrimentos da humanidade e ensinar aos homens o sentido da vida terrena, na Páscoa o Filho do Homem revela sua divindade, volta ao seio do Pai para mostrar aos homens o caminho da verdadeira vida.

         Apesar de todos os anos celebrarmos tão grande solenidade, nós ainda nos apoiamos e confiamos nas forças visíveis, nas vitórias deste mundo, em tudo que nos pareça uma garantia de um poder visível. Esquecemos, entretanto que Jesus se cansara de anunciar aos seus íntimos que o preço da vitória é a derrota, a garantia da vida é a morte, a chave da alegria o sofrimento. E este é o sentido desta Páscoa de 2015: num mundo que anda armado, e “armado até os dentes” devido a uma desconfiança perene do vizinho, é preciso compreender que não são tais armas que salvarão o mundo e sim a força moral e espiritual da regeneração pelo espírito. É preciso que o homem deixe seus vícios, não volte ao pecado, pois a volta ao pecado é muito mais perigosa que o próprio pecado.

         Este é o espírito pascal que já começamos a viver no Natal. O Natal se interpreta pela Páscoa. Por isso precisamos celebrar cada festa cristãmente. E o sinal disso é que tudo ter um sentido perene, duradouro, em função de uma vida maior, sem deixar o pretexto do comércio engolir nossa fé.


         Caríssimos leitores e leitoras: “Cristo ressuscitou verdadeiramente, Aleluia!”. Não por símbolo, por imaginação ou por desejo dos discípulos. Ressuscitou verdadeiramente. Vivamos, portanto, em espírito de verdade, procurando em tudo a verdade, fugindo do erro e da mentira, pois só assim seremos fiéis ao Natal e à Páscoa.

Amém!

Para concluirmos nossa série de artigos sobre a Fé da Igreja falaremos hoje sobre uma palavra que sempre pronunciamos, mas que, nem sempre, compreendemos seu significado: a palavra “Amém”. Esta palavra sempre conclui nossas orações que rezamos, particularmente o Credo que professamos. É uma palavra de origem hebraica que comporta a ideia de rochedo, de solidez. É aquilo ao qual podemos agarrar-nos para sermos salvos, mesmo quando tudo parece desmoronar. Daí também a ideia de confiança e abandono na Palavra e no projeto de Deus, porque ele nos ampara e nos sustenta.
            Dessa forma, Jesus é o Amém do Pai, pois durante toda a sua vida, e especialmente durante sua Paixão, apoiou-se apenas no Amor do Pai e aderiu totalmente à vontade de salvação, até a morte de Cruz.
            A partir da sua ressurreição, seu “Amém” espalha-se pelo mundo todo, entra no coração do cristão pela fé e sempre acaba por mostrar-se a quem procura a verdade com honestidade e perseverança. Pelo mistério da Cruz, em que por seu “Amém” doloroso Jesus transforma toda a morte em Vida Eterna, todo mal em potência de salvação para o mundo.

            Por isso, todas as vezes que dizemos “Amém” dá uma adesão total ao Senhor, se entrega totalmente a ele. Em nossos corações, esse “Amém” vitorioso de Jesus nada mais é que a fé. E com o nosso Amém afirmamos mais uma vez: creio e professo.

Creio na ressurreição da carne e na vida eterna

        Todos nós cristãos devemos ter uma fé firme e inabalável na ressurreição. Essa é a condição primordial que nos garante o direito de sermos chamados de cristãos. Isso porque todo o cristianismo foi fundado a partir da certeza de que Cristo ressuscitou e venceu a morte e, a partir disso, nós também ressuscitaremos e viveremos para sempre, já que fomos criados não para uma vida transitória, mas imortal.
            Para crermos e professarmos esta verdade de fé, é preciso saber o que é ressuscitar. Ressuscitar não é apenas voltar à vida, mas ter nosso corpo corruptível transformado e glorificado, sem necessidade de ocupar um lugar no espaço, não vai mais envelhecer, não vai mais morrer. Acontecerá conosco o que aconteceu com Cristo. Dessa maneira, todos nós, em Cristo, ressuscitaremos com nosso próprio corpo, que temos agora. Isso acontecerá definitivamente no “último dia” ou no “fim do mundo” (cf. 1Ts 4,16).
            Além disso, é verdade que, de certa maneira, já ressuscitamos com Cristo, pois, pela ação do Espírito Santo, nossa vida cristã é, já agora na terra, uma participação na morte e ressurreição de Cristo. Devemos essa participação ao batismo que nos torna participantes da vida celeste de Cristo ressuscitado.
            O cristão deve crer também que não fomos apenas criados para viver alguns anos aqui na terra, como transeuntes. Fomos criados para a eternidade. Por isso, a morte não é o fim de nossa vida, nem é ponto de chegada, mas início da nova e definitiva vida. A isso chamamos de vida eterna.
            Para podermos nos encontrar com Deus e ressuscitar com Cristo, é preciso deixar a mansão deste corpo para ir morar junto do Senhor (cf. 2Cor 5,8). Graças a Cristo, a morte cristã tem sentido positivo: é o fim da vida terrena do homem, que foi tempo para o acolhimento ou recusa da graça divina, manifestada em Jesus Cristo. É momento em que nos colocamos diante de Cristo para a felicidade definitiva (céu), mais um período de purificação (purgatório) ou a condenação eterna (inferno).

            Essa consumação, encontro do homem com Cristo, justo juiz da história, será a realização última da unidade do gênero humano, querida por Deus, desde a criação e da qual a Igreja peregrina no mundo é apenas um “sinal” ou “sacramento”. Os que estiverem unidos a Deus formarão a comunidade dos remidos e Deus será tudo em todos, na vida eterna (cf. 1Cor 15,28).

Creio na Remissão dos Pecados

            Este artigo da fé possui íntima ligação com a doutrina do Espírito Santo, isso porque foi o próprio Cristo Ressuscitado quem, no dia da Páscoa, disse aos Apóstolos: “Recebei o Espírito Santo. A quem perdoardes os pecados, serão perdoados; a quem os retiverdes, lhes serão retidos” (Jo 20,22b-23). Isso nos certifica que é pelo dom do Espírito Santo que os Apóstolos receber o poder de perdoar os pecados, em nome de Jesus Cristo.
            Todavia, o Catecismo afirma que o primeiro grande sacramento do perdão é o batismo: “O batismo é o primeiro e principal sacramento do perdão dos pecados, porque nos une a Cristo, morto pelos nossos pecados e ressuscitado para a nossa justificação, para que, como diz São Paulo ‘nós também vivamos uma vida nova’ (cf. Rm 6,4)”.
            Jesus sabia que o ser humano, mesmo depois de ter recebido o batismo, voltaria a pecar, pois conhecia suas fraquezas e limitações. Por isso deixou para a Igreja este poder: o de perdoar as faltas a todos os penitentes até o último instante da vida.
            É um pouco difícil compreender como um homem pode perdoar os pecados, mas Jesus confere este poder. A Igreja é a fiel depositária deste poder de abrir ou fechar ao perdão. Na sua misericórdia, Deus perdoa cada homem, mas Ele mesmo quis que quantos pertencem a Cristo e à Igreja recebam o perdão mediante os ministros da Comunidade. Através do ministério apostólico, a misericórdia de Deus nos alcança, nossas culpas são perdoadas e nos é conferida a alegria. A Igreja não é senhora do perdão, mas é serva do ministério da misericórdia e rejubila todas as vezes que pode oferecer este dom divino.
Talvez muitas pessoas não compreendam a dimensão eclesial do perdão, porque predominam sempre o individualismo e o subjetivismo. Sem dúvida, Deus perdoa cada pecador arrependido, pessoalmente, mas o cristão está unido a Cristo, e Cristo à Igreja.
            Quando nós afirmamos crer na remissão dos pecados, queremos dizer que nos colocamos em sintonia com a Igreja que nos apresenta os sacramentos do Batismo, da Penitência e a Unção dos Enfermos, para os enfermos que não podem se confessar mas estão perfeitamente arrependidos.


Creio na comunhão dos Santos

Irmãos, o artigo desta edição completa, sem dúvida nenhuma, o artigo anterior “Creio (na) Igreja Católica”, pois a Igreja é a Comunhão dos Santos. A expressão designa, em primeiro lugar, as “coisas santas”, sobretudo a Eucaristia, em redor da qual a Igreja se reúne para sua salvação e para a sua missão católica. Mas precisamente por isso, a consequência imediata foi a passagem para a “comunidade das pessoas santas”. A partir daí, lançamos um olhar sobre o mistério insondável: “porque Jesus “morreu por todos”, ninguém pode doravante viver e morrer para si só” (2Cor 5,14s); mas numa renúncia de cada um a si mesmo por amor, o que há de bom pertence a todos. Daí resulta um intercâmbio entre todos os membros do corpo eclesial de Cristo.
Que nos garante tudo isso é o batismo. Vemos na escritura que “desde já somos filhos de Deus, mas nem sequer se manifestou o que seremos!” (1Jo 3,2a). Isso significa que o Batismo não é uma experiência isolada e momentânea, mas ela se projeta para a vida toda do batizado, inclusive na vida eterna.
O chamado para partilhar da comunhão e da amizade com Deus é o fundamento para uma vida de santidade, sendo o próprio Cristo autor e operador da santidade. Para tanto, somos, a partir do Batismo, incorporados em Cristo e no seu Corpo, a Igreja: “De fato, o corpo é um só, mas tem muitos membros; e, no entanto, apesar de serem muitos, todos os membros do corpo formam um só corpo. Assim acontece também com Cristo. Pois todos foram batizados num só Espírito para sermos um só corpo” (1Cor 12,12-13). É exatamente isto que professamos ao rezar o Creio e dizermos “creio na comunhão dos santos”.
Comunhão dos santos é a união de Jesus Cristo, cabeça da Igreja, com todos os seus membros e, por sua vez, entre esses mesmos membros. Por esta comunhão os méritos de Cristo e de todos os santos que nos precederam na terra ajudam-nos na missão que o próprio Senhor nos pede para realizar na Igreja.

Resumindo: essa união entre os membros do Corpo de Místico de Cristo se dá por uma comunhão de fé, de preces, da vida sacramental e dos carismas. Essa realidade eclesiológica ultrapassa o tempo e o espaço, tanto que a morte não interrompe a comunhão existente entre os seres humanos.
Creio (na) Santa Igreja Católica

Conforme nos diz a Constituição Dogmática “Lumen Gentium” sobre a Igreja do Concílio Vaticano II, é preciso anunciar o Evangelho aos homens e iluminá-los com a claridade de Cristo que resplandece na face da Igreja (cf. LG 1). Com isso, vemos que este artigo sobre a Igreja depende dos artigos referentes a Jesus e, igualmente, depende do artigo anterior que se refere ao Espírito Santo, pois a Igreja é o lugar onde floresce o Espírito.
            Crer que a Igreja é Una, Santa, Católica e Apostólica é inseparável da fé em Deus Pai, Filho e Espírito Santo. Dessa forma, seria mais correto professarmos em nosso Credo que cremos em uma Igreja Santa, dizendo “creio a Igreja” (em latim: Credo Ecclesiam) e não “Creio na Igreja” (Credo in Ecclesiam) como fazemos habitualmente, para não confundirmos Deus com suas obras e para atribuir claramente à bondade de Deus todos os dons que ele pôs em sua Igreja. Em outras palavras, reconhecemos, na fé neste Deus, o que Ele se dignou a fazer por nós.
            A Igreja (do grego ekklésia que significa convocação) é o primeiro dom de Deus. É pressuposto que ela existe e é conhecida; o crente individual que diz “eu creio”, fá-lo no interior de uma comunidade. É a imagem o Israel de Deus, povo santo e sacerdotal, cuja a flor mais formosa tornou-se a Mãe do Salvador; este deu esta mãe aos pés da Cruz como modelo ao seu novo “Israel de Deus” (cf. Gl 6,19). O Espírito em Pentecostes termina esta obra e concede aos membros da comunidade a capacidade de levar a cabo no mundo inteiro a ordem de missão do Filho. A Igreja, enraizada em Israel, elevada, através da Eucaristia do Filho, à dignidade de ser corporalmente sua esposa e tornada, pelo Espírito, capaz de uma resposta condigna, é sem dúvida um produto do Deus Uno e Trino que leva ao cumprimento a criação.
            Por isso, a Igreja é ao mesmo tempo visível e espiritual, sociedade hierárquica e Corpo Místico de Cristo. Ela é uma, formada de um elemento humano e um elemento divino. Somente a fé pode acolher este mistério que a torna Sacramento de Salvação no mundo presente e o instrumento da comunhão de Deus e dos homens.